Saturday, November 17, 2007

Embriaguês Nacional

Esse texto eu escrevi logo depois da decisão do senado brasileiro de absolver o senador Renan Calheiros no dia 12 de setembro de 2007. Renan era acusado de pagar despesas pessoais com recursos do lobista Cláudio Gontijo, funcionário da construtora Mendes Junior.

Segue o texto:

Hoje é o dia da ex-futura cassação do senador Renan Calheiros e Jô Soares está discutindo o tema em seu programa afirmando que, apesar de “toda a opinião pública contra”, o presidente do senado foi absolvido.

Não estou aqui para discutir o mérito da questão. Acho que o senador tem sua culpa sim, mas que também há muitos outros com o “rabo preso” e não vem ao caso entrar nesse ponto. Gostaria de abordar o caso de uma maneira mais ampla. Os senadores, assim como todos os representantes públicos eleitos por meio do voto, são escolhidos pelo povo e representam (ou deveriam representar) a média da opinião da população. Ponto. Então por que se vê tanta manifestação e descontentamento dos eleitores, quando foram eles mesmos que elegeram os políticos? Por que temos sempre a sensação de não ter a nossa opinião defendida? Ou de forma mais genérica: se, em teoria, a opinião dos governantes é um reflexo da opinião da sociedade, como essas duas opiniões são, com frequência, tão diferentes?
Muita gente vive acusando os políticos de corruptos, de ladrões, de inescrupulosos, etc. Não venho defender os políticos e sim acusar a própria população (incluindo a mim mesmo). Nós somos os próprios corruptos, ladrões e inescrupulosos. Ficamos injuriados com os casos de troca de favores e somos os primeiros a estar de acordo com uma propina de 30 ao invés de uma multa de 300. Ficamos enfurecidos com o caso mensalão, quando nós mesmos damos uma “ajeitadinha” na nossa declaração de imposto de renda. Ficamos “putos” com a sujeira no senado, quando nós mesmos jogamos sujeira no chão das ruas e das praias brasileiras. Julgamos a conduta de diversos políticos e pessoas, quando nós mesmos conduzimos embriagados.
Alguém poderia dizer: Sim.. mas não se pode comparar uma simples propina de 30 reais com um desvio de verba de milhões, são casos de níveis de grandeza absolutamente diferentes. Se analisarmos os dois casos isoladamente, sim; mas se levarmos em consideração a quantidade de brasileiros que dão um “jeitinho” com o guarda, vemos que as ordens de grandeza passam a se equiparar. Se juntarmos toda a sujeira que jogamos no chão, vemos a que ponto a sujeira na política pode chegar. Se acumularmos a quilometragem de todos os brasileiros que já conduziram absolutamente embriagados, podemos perceber a que nível de embriaguez pode chegar um país.
Então, o que está se passa realmente nessa aparente divergência entre a sociedade e os políticos escolhidos para representá-la é mera hipocrisia. Nós julgamos o comportamento dos outros e esquecemos de olhar o nosso. Nós acusamos os outros tentando esconder nossas próprias más condutas. É duro mas é verdade.
A grande mudança que se espera na sociedade brasileira não é algo que venha de cima pra baixo, mas sim de baixo pra cima, isto é, começando com a mudança de cada um.

2 comments:

Karine Porpino Viana said...

Quando eu vi "Tropa de Elite",eu pensei sobre isso: um filme que fala de corrupção foi o filme mais piratiado da história. É a contradição do brasileiro. É a contradição do ser humano.
Infelizmente nós (também me incluo nisso) nos habituamos a nos desresponsabilizarmos. Achamos que público significa não ser de ninguém, quando na realidade o que é público é de todo mundo. E se é de todo mundo, porque é só culpa dos outros?

Massa o texto, Gui! Beijos!

Igor Gatis said...

Tá no dia a dia do brasileiro a idéia de que o bem sucedido é o esperto e não o trabalhador. É triste. Talvez seja pq nós já estamos acostumados ou não sabemos que isso pode/deve ser diferente.

A mudança começa em cada um. De cedo, de berço. E se o sentimento é de estar nadando contra a maré, lembre-se de que vc não quer fazer parte da maré e também não quer atrapalhar quem não quer ser.

É tema velho, mas é tema vivo.